Fortaleza sedia debate sobre o Fracking

MEIO AMBIENTE
07 de outubro de 2016

A capital cearense sediou, na última quinta-feira (6), um debate sobre fraturamento hidráulico, técnica não convencional para extração do gás de xisto, mais conhecida como Fracking. Ministrada pela diretora da 350.org Brasil e América Latina, e coordenadora nacional da Coalizão Não Fracking Brasil pelo Clima, Água e Vida (Coesus), Nicole Figueiredo de Oliveira, a palestra aconteceu durante a 245ª Reunião Ordinária do Conselho Estadual do Meio Ambiente (COEMA). O presidente da Associação dos Municípios do Estado do Ceará (Aprece), Expedito José do Nascimento participou do evento. O debate, fruto de articulação da campanha Não Fracking Brasil, contou com a presença de autoridades estaduais e municipais, lideranças indígenas e da sociedade civil, e teve por objetivo informar os conselheiros e a sociedade sobre a prática, que tem preocupado diversos municípios em todas as regiões do país.

Nicole falou à plateia sobre os riscos associados à prática no fracking e de como o Ceará, com o grande potencial para geração de energia a partir de fontes renováveis, pode se tornar um estado sustentável, servindo de exemplo para diversas outras localidades no Brasil e no mundo. “Nosso país tem fontes renováveis em abundância, suficientes para não precisarmos mais investir em nenhum tipo de hidrocarboneto. O Ceará e a região Nordeste como um todo têm enorme potencial para geração eólica e solar, não faz sentido incentivar uma energia extremamente poluente, que coloca em risco a segurança hídrica e alimentar da população, sem falar nos riscos à saúde e os impactos na economia. O planeta urge por uma mudança de paradigma rumo a uma economia que reduza as emissões de carbono para a atmosfera, a fim de conter o aquecimento global e as mudanças climáticas”, afirmou.

O encontro foi realizado pelo Governo do Estado do Ceará através da Secretaria Estadual do Meio Ambiente (Sema) e da Superintendência Estadual do Meio Ambiente (Semace), em parceria com a Aprece. O presidente da entidade municipalista, Expedito José do Nascimento, foi quem propôs a temática, a fim de alertar sobre os perigos do método para a saúde da população, a água, o solo e a agropecuária, além de debater as possibilidades de articulação política e jurídica para banir seu uso no estado.

“Fomos pegos de surpresa quando, no ano passado, o governo tentou passar uma resolução para incentivar investimentos para termelétricas a gás no estado. Usando dados maquiados, eles tentaram justificar que o gás emite menos menos do que carvão, mas aí entra justamente a questão da tecnologia perigosa dofracking. Nos mapeamentos feitos para os leilões da ANP [Agência Nacional de Petróleo e Gás], temos 3 ou 4 municípios, incluindo Aracati, onde a ameaça já é iminente”, relatou Nicolas Fabre, assessor de Desenvolvimento Rural e Meio Ambiente da Aprece.

Altamente poluente, o fracking utiliza milhões de litros cúbicos de água misturados com areia e mais de 600 solventes químicos, muitos deles radioativos, para promover a fratura da rocha e obter o gás. Cerca de 40% deste fluido hidráulico retorna à superfície, enquanto o restante permanece no subsolo, próximo às fontes de água. Dessa forma, o método não só inviabiliza a atividade agrícola e agropecuária pela contaminação da água, solo e ar, como também causa doenças como câncer e outros prejuízos à saúde humana e animal. Além dos impactos econômicos e socioambientais, a técnica também intensifica as mudanças climáticas, uma vez que libera sistematicamente o metano, gás causador do efeito estufa que, num período de 20 anos, pode ser 86 vezes mais danoso que o CO², de acordo com o 5º Relatório de Avaliação do Painel Intergovernamental sobre Mudança do Clima (IPCC).

“Com essa intenção, o governo do nosso estado vai justamente na contramão dos compromissos assumidos pelo país internacionalmente, ao ratificar o Acordo de Paris. No Ceará estamos enfrentando o quinto ano de seca e ainda temos que lutar contra a entrada de termelétricas que trarão um enorme desperdício de água para que possam funcionar. Dessa forma, deixamos de dar incentivos a energias limpas, e temos que fazer essa transição agora, não podemos esperar mais”, frisou Fabre.

Apesar da falta de informação e consulta à sociedade, o fracking já vem sendo utilizado no Brasil e no Ceará sem qualquer tipo de controle, acompanhamento ou fiscalização dos órgãos ambientais competentes, sejam eles em âmbito federal, estadual ou municipal. Em todo o Brasil, centenas de municípios já aprovaram Projetos de Lei que proíbem a prática, um resultado direto da campanha Não Fracking Brasil, coordenada pela COESUS.

No dia 20 de setembro, a cidade de Aracati, no litoral Leste do Ceará, também entrou para o rol de municípios livres do Fracking. Por unanimidade, a Câmara de Vereadores local aprovou uma emenda à Lei Orgânica do Município, que proíbe operações para extração do gás de xisto por faturamento hidráulico. A votação contou com a participação intensa da comunidade local, graças à mobilização popular organizada pelo Fórum Comunitário de Aracati, com apoio da 350.org Brasil e Fórum Ceará no Clima, entidades membros da COESUS. Aprovada em primeiro turno, a emenda será apreciada novamente na próxima segunda-feira, dia 10 de outubro.

Em maio deste ano, outra ação organizada na região pela COESUS e 350.org, com apoio do Fórum Ceará no Clima, fez parte do movimento Liberte-se dos Combustíveis Fósseis, que no Ceará teve como mote a campanha contra as termelétricas. A ação teve início na comunidade tradicional de Bolso, pertencente ao território do povo indígena Anacé, e uma das mais impactadas pelo Complexo Industrial e Portuário do Pecém. Além, disso, também foi realizada uma audiência pública em Juazeiro do Norte para informar a sociedade sobre as ameaças do fracking.

Além do Ceará, os estados do Piauí, Sergipe e Alagoas já tiveram o subsolo leiloado pela ANP para a indústria do fracking. “Tivemos que ir a Brasília, falar com o Governo do Paraná, para tomar conhecimento do que estava acontecendo no setor energético daqui. Essa falta de transparência é muito preocupante. Precisamos saber a real abrangência desse risco no nosso estado. Para isso, percebemos que é importante envolver não só os municípios nessa discussão, como também o governo estadual, para que ele acorde para o assunto desde já. O debate é uma forma de incentivar os estados e municípios do Nordeste a fortalecer esse movimento em toda a região”, completou Nicolas Fabre.

Fonte: 350.org

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