No Ceará, ações municipais promovem a agroecologia

SUSTENTABILIDADE
04 de novembro de 2020

A produção de alimentos respeitando a natureza e a biodiversidade, sem uso de agrotóxicos ou fertilizantes industriais, a promoção da equidade de gênero na agricultura, o respeito ao conhecimento tradicional dos trabalhadores rurais e o empoderamento da agricultura familiar como forma de combater o latifúndio são algumas das definições do que é a agroecologia. Difundida como uma alternativa ao grande agronegócio, é considerada uma forma alternativa e sustentável de desenvolvimento rural.

Uma das suas principais divulgadoras, a Articulação Nacional de Agroecologia (ANA), realizou um levantamento com iniciativas de apoio à agroecologia em 530 municípios do Brasil, todas contando com o apoio do poder público municipal. O documento, “Municípios Agroecológicos e Políticas de Futuro”, sistematizou 725 iniciativas municipais em apoio à agroecologia no Brasil, organizadas em 13 campos temáticos.

No Nordeste, foram mapeadas um total de 224 experiências, sendo a região com o segundo maior número de ações sistematizadas, perdendo apenas para a região Sul. O Ceará está entre os estados com o maior número de iniciativas mapeadas, contando com 39 ações do poder público municipal em apoio à agroecologia, além de ter o município de Piquet Carneiro como um dos cinco municípios que concentram o maior número de iniciativas.

Para Carla Galiza, agrônoma e pesquisadora do projeto “Agroecologia nas Eleições”, o Ceará tem uma expressão agroecológica muito forte, sendo uma referência inclusive no Brasil. Um dos motivos elencados pela pesquisadora é a grande quantidade de organizações da sociedade civil que tratam do tema em diversos municípios do estado. “Eu acredito que a incidência dessas organizações nos municípios de atuação, refletem de alguma forma a ação da gestão municipal, principalmente quando a gestão é aberta para o debate, quando é aberta para a expressão da agroecologia”, afirmou Carla Galiza.

Campeão de Iniciativas

O município de Piquet Carneiro, localizado na região dos Sertões Cearenses, teve 10 ações da prefeitura mapeadas pela ANA. Entre os projetos estão o “Dia D da Agricultura Familiar”, que visa promover a troca de experiências sobre a produção orgânica entre agricultores e técnicos, além de haver a comercialização dos produtos dos agricultores. Outro projeto que se destaca é o que trata sobre o fortalecimento da cadeia produtiva do mel, que ajuda aos apicultores a desenvolver um aumento da renda por meio da exploração racional das abelhas.

A 332 km da capital Fortaleza, o município Piquet Carneiro ainda executa projetos que ajudam a garantir a segurança hídrica e convivência com o semiárido, através de perfuração de poços, recuperação de reservatórios e disponibilização de carros pipas durante os períodos mais críticos. Ainda há ações de compra da produção agroecológica pelo município através do Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) e do Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE).

Educação contextualizada

Conhecida como a terra dos três climas, por em seu território haver praias, serras e sertão, Itapipoca é um município que fica situado na região norte do Ceará. Uma outra característica da cidade é uma parte considerável dos seus munícipes viverem na zona rural, dos 116.065 habitantes da cidade, 42,35% estão nas áreas rurais da cidade. Reflexo dessa realidade é a quantidade de escolas localizadas fora dos centros urbanos: são 89 escolas na zona rural, de um total de 116 estabelecimentos de educação do poder municipal.

O projeto de educação contextualizada “Do meu lugar, a nossa história” foi uma experiência iniciada pela Cáritas Diocesana de Itapipoca no distrito de Arapari. Posteriormente serviu de base para criação de uma lei aprovada pela Câmara de Vereadores de Itapipoca em 2017, que “define as diretrizes básicas de Educação Contextualizada de Educação no Campo”, além de estar presente também no Plano Municipal de Educação.

O projeto que prevê formação continuada para os professores do ensino fundamental, tem como objetivo contribuir com a qualificação dos educadores no processo de ensino e aprendizagem dos estudantes através da educação contextualizada e do conceito de convivência com o semiárido.

Paulo Henrique Barroso, secretário de Educação Básica de Itapipoca, em entrevista para a pesquisadora da ANA afirma que o fato da cidade ter três realidades geográficas distintas foi uma das motivações para o desenvolvimento do projeto, “havendo com isso a necessidade de se trabalhar essas realidades dentro de sala de aula, de forma que a agricultura, a pecuária, a vegetação, os mananciais hídricos, as formas de organização, as culturas das comunidades sejam trabalhadas significativamente dentro do processo pedagógico”.

A educação contextualizada é inspirada pelo pensamento do pedagogo Paulo Freire e tem como pressuposto a relação de aprendizagem entre educandos, educadores e o os contextos naturais, históricos e culturais que envolvem os agentes da educação. Também faz parte da educação contextualizada a compreensão de que os problemas e a realidade dos educandos possibilitam a articulação dos conhecimentos prévios desses com o conhecimento científico.

O projeto que é realizado através de uma parceria entre a Cáritas Diocesana de Itapipoca e a Secretaria de Educação Básica de Itapipoca teve início em 2018 e tem uma participação média de 560 educadores.

Segurança Alimentar

Uma das preocupações da agroecologia é a Segurança Alimentar e Nutricional, que segunda a Lei nº 11.346, “entende a realização do direito de todos ao acesso regular e permanente a alimentos de qualidade, em quantidade suficiente, sem comprometer o acesso a outras necessidades essenciais, tendo como base práticas alimentares promotoras de saúde que respeitem a diversidade cultural e que sejam ambiental, cultural, econômica e socialmente sustentáveis. ”

É nesse sentido que a Prefeitura de Sobral, também no norte do Ceará, atua desde 2005 promovendo a Segurança Alimentar e Nutricional através do Restaurante Popular, o primeiro a ser construído no estado, através de uma parceria com o hoje extinto Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS).

Atualmente o restaurante tem capacidade de servir mais de duas mil refeições por dia, divididas entre café da manhã e almoço, tendo, no mínimo, 70% dos insumos in natura ou processados, adquiridos da agricultura familiar através do Programa de Aquisição de Alimentos/Compra Direta Local da Agricultura Familiar (PAA/CDLAF).

Contando com representantes da sociedade civil, o Conselho de Segurança Alimentar e Nutricional de Sobral (Consea) é o órgão responsável por monitorar o funcionamento do restaurante, que oferece refeições a partir de R$ 1 real para a população em situação de vulnerabilidade social.

Fonte: BdF Ceará